A Bahia registrou 9.925 casos de dengue no primeiro bimestre deste ano e está sem estoque do inseticida que combate o mosquito aedes Aegypti, transmissor da doença. O número de casos da arbovirose neste ano já é 55% maior do que no mesmo período do ano passado. Os dados são da Secretaria Estadual da Saúde (Sesab), que confirmou a falta do inseticida. Ao todo, segundo a pasta, o estado tem apenas 43 litros. O produto é enviado pelo Ministério da Saúde (MS) e a última remessa ocorreu em julho de 2022, oito meses atrás.
Os 43 litros do produto usado para matar os mosquitos adultos, é suficiente apenas para suprir a demanda média de um município baiano. A falta do inseticida se deve à ausência do Imidacloprida + Praletrina, as substâncias usadas nos carros de ‘fumacê’ em áreas com alta incidência de casos de dengue.
O Ministério da Saúde foi procurado para responder sobre novas remessas das substâncias e justificou o hiato no envio: “Houve problemas na aquisição do inseticida, que foram iniciados em 2021, pela gestão passada, resultando em atraso no fornecimento, conforme informado aos estados e municípios”, respondeu a pasta, ressaltando que a atual gestão federal resolveu as pendências e aguarda a chegada do produto dos fornecedores.
Não foi dita uma data exata de quando o inseticida será distribuído para os estados. A previsão, no entanto, é que chegue nas próximas semanas, de acordo com o MS, que diz não haver desabastecimento de outros tipos de produto e pondera sobre o uso do ‘fumacê’:
Vale informar que o inseticida para a aplicação espacial é uma ferramenta para o controle vetorial, que deve ser utilizada apenas em situações emergenciais, para bloqueio de transmissão”, aponta a pasta.
Estratégia
Epidemiologista e professora do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Maria da Glória Teixeira acrescenta que, além de ser destinada para situações de emergência, a nebulização [fumacê] é uma estratégia localizada.
“O fumacê tem uma recomendação muito precisa. A de que, se em um determinado local e bairro, está havendo um aglomerado de casos, há indicação do uso do inseticida para matar os mosquitos que já estão circulando em sua fase adulta”, diz a médica.
Ainda assim, de acordo com o médico infectologista Matheus Todt, a ausência do inseticida é preocupante e não deve ser tratada como algo pequeno. “O inseticida, junto com a orientação da população e fiscalização dos agentes, faz parte do controle do vetor, que é o mosquito. Então, não dá para dizer que não vai impactar. É importante também no controle em pontos críticos”, enfatiza Todt.
Dengue no condomínio
O condomínio do advogado Matheus Jucá, 23 anos, já registrou mais de um caso. O próprio advogado está com diagnóstico de dengue desde a semana passada e tem conhecimento de, no mínimo, outros três vizinhos que tiveram a doença recentemente.
“Os sintomas foram pesados, muita dor no corpo e atrás dos olhos, febre e dor de cabeça. Outras três pessoas positivaram no último mês aqui onde eu moro e até já chamamos a Vigilância Sanitária para ver se há um foco de transmissão”, conta Matheus, que mora no bairro de Patamares.
Salvador tem apresentado uma curva de crescimento que assusta quando o assunto são os casos da arboviroses. A capital registrou 1.066 casos da doença entre janeiro e março deste ano, o que representa um aumento de 773% em relação ao mesmo período do ano passado – quando 122 casos foram notificados. O número preocupa especialistas e acende o alerta para a execução de todas as ações de combate à proliferação da doença.
A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) foi procurada para responder sobre o estoque de inseticida na capital e afirmou contar com uma quantidade suficiente para as atividades rotineiras de controle. Porém, destacou a necessidade de reposição do material, situação que, de acordo com a pasta municipal, já foi informada à Sesab, “para que não haja comprometimento da rotina a médio e longo prazo, o que impactaria no combate ao mosquito Aedes aegypti”.
Reforçar medidas é necessário
Em caso de ausência dos caminhões de fumacê pela falta do inseticida anti-mosquito da dengue, médicos reforçam a necessidade da população ter ainda mais atenção ao bê-á-bá das medidas de proteção individuais e coletivas contra a dengue. A epidemiologista Maria da Glória Teixeira lembra da importância de revisar os cantos da casa para ver se está tudo certo.
Olhe tudo de casa, faça uma limpa. Verifique o esgoto, a descarga, o quintal e observe para saber se no seu lar não há um ambiente em torno de você com o hábitat próprio para o Aedes aegypti”, indica a especialista.
Apesar da Anvisa ter aprovado, em janeiro deste ano, a vacina contra a dengue, o imunizante ainda não está no programa nacional de vacinação. Sem vacina, o infectologista Matheus Todt reforça o valor do cuidado comunitário.
“Não pode deixar ponto de proliferação e vale conversar com vizinhos. Se eu me cuidar e os outros não, pode pegar do mesmo jeito. O raio de ação do mosquito é de 100 metros. Então, o diálogo é preciso”, indica o médico.
No cuidado individual, que independe da localização e pode ser definitivo na hora de evitar ser picado pelo mosquito, Maria da Glória lembra do bom e velho repelente: “É fundamental para todos e, principalmente, para as gestantes que precisam evitar a microcefalia [decorrente da zika]. O uso é recomendado porque a fêmea, que transmite a arbovirose, não consegue picar quem faz esse uso do repelente de forma geral”, orienta.