O Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), durante a sessão plenária ocorrida na última sexta-feira (12) instaurou um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), com afastamento das funções, contra a juíza Marlise Freire Alvarenga. O julgamento, que ocorreu em sessão sigilosa, avançou após o desembargador Sérgio Cafezeiro liberar o voto vista que havia solicitado, confirmando a abertura do procedimento.
A decisão foi formalizada no processo de sindicância, que tem como relator o corregedor Geral da Justiça, desembargador Roberto Maynard Frank. A publicação da decisão revela a unanimidade na instauração do processo contra a magistrada e a ratificação do seu afastamento, esta última por maioria de votos.
A juíza, conhecida como “cinquentinha”, pelos valores que supostamente cobra por decisões, é alvo de diversas apurações nos últimos anos, e está envolvida em investigações que, em grande parte, são desdobramentos da OperaçãoFaroeste, que apura um complexo esquema de grilagem de terras e corrupção no Judiciário baiano.
Rito do Processo Administrativo Disciplinar
O procedimento disciplinar contra juízes e desembargadores é um rito complexo e formal, regido principalmente pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) e pela Resolução nº 135/2011 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O objetivo é apurar a ocorrência de faltas e aplicar as punições cabíveis, assegurando sempre o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.
Antes da instauração formal do PAD, é comum a fase de investigação preliminar.
Sindicância: É um procedimento investigatório, sigiloso, que visa colher indícios de autoria e materialidade de uma suposta infração disciplinar. É uma etapa preparatória, não punitiva, mas que pode gerar o afastamento preventivo do magistrado, como ocorreu neste caso, se for necessário para a “conveniente apuração dos fatos” ou por “interesse público”.
Defesa Prévia: Após a Corregedoria concluir a sindicância e propor a abertura do PAD, o magistrado tem o direito de apresentar uma Defesa Prévia ao Tribunal.
Instauração do PAD
Com base na sindicância e na defesa prévia, o Pleno do Tribunal decide se há indícios suficientes para abrir o PAD.
Instauração e Instrução: Uma vez instaurado o PAD, é realizada a instrução processual, que inclui a coleta de provas, oitiva de testemunhas e interrogatório do magistrado, garantindo-lhe a ampla defesa e o contraditório. Em alguns casos, o processo corre em sigilo para preservar a imagem do Judiciário e do magistrado, embora o julgamento final seja público, salvo exceções.
Julgamento: O julgamento final é realizado pelo Tribunal Pleno, exigindo-se o voto da maioria absoluta dos membros para a aplicação das punições. Para os casos criminais, a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) exige o voto de dois terços do respectivo tribunal.
Punições Aplicáveis
As penalidades disciplinares que podem ser impostas a magistrados estão listadas na Lomane na Resolução CNJ nº 135/2011, e variam em gravidade:
Advertência: É a punição mais branda, aplicada em casos de negligência no cumprimento dos deveres, quando a conduta não justificar punição mais grave. É sigilosa, mas registrada.
Censura: Aplicada em casos de reiteração de negligência ou procedimento incorreto. Tem um efeito prático de impedir o magistrado de receber promoção por merecimento por um ano.
Remoção Compulsória: Transferência forçada para outra Comarca ou Vara, por interesse público. Aplicada por conduta reiterada de desídia (preguiça) ou falta de urbanidade.
Disponibilidade: Afastamento do magistrado de suas funções, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. Aplicada por interesse público, falta grave ou insuficiência de desempenho.
Aposentadoria Compulsória: A pena máxima administrativa. O magistrado é aposentado com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. Aplicada por interesse público ou infração gravíssima.
Perda do Cargo: Aplicada a juízes vitalícios apenas por decisão judicial (ação específica), não por PAD.
Histórico de Acusações
A juíza Marlise Freire Alvarenga, titular da comarca de Barreiras, no oeste baiano, tem um histórico de apurações na Corregedoria do TJBA e no CNJ, frequentemente ligadas a casos de grande valor patrimonial e, mais recentemente, à Operação Faroeste.
Um dos focos do atual PAD é a acusação de que a magistrada teria atuado em processos milionários após ter declarado sua suspeição. O relator, desembargador Roberto Frank, manteve a abertura do PAD neste eixo de apuração, indicando que a conduta configuraria grave infração aos deveres funcionais, especialmente em casos que envolvem cancelamentos irregulares de matrículas.
Investigações Anteriores: A magistrada já foi alvo de outras sindicâncias, como a que apurava uma nova linha de investigação dentro da Operação Faroeste e o caso de um cartório de Barreiras que foi multado em R$ 20 mil em uma transação imobiliária que envolvia seu filho.